Joalherias são sempre lindas! Nunca se vê ninguém comprando nada dentro delas, mas elas estão sempre lá: pomposas, brilhantes... Até esse dia, ele achava que elas serviam só pra enfeitar os corredores de shopping centers.
Hoje ia entrar em uma. Escolheu a mais bonita do shopping, foi até a vitrine mais vazia: só tinha um relógio. Procurou o preço, e encontrou um número escrito num cantinho bem pequenininho em letras bem miudinhas: 58998. Provavelmente era só um código de referencia ou talvez a quantidade em estoque. Ou podia ser que estivesse faltando a vírgula dos centavos. Não, não, estava certo. Ficou imaginando que "poder" teria o tal relógio pra custar tanto? Vai ver ele consegue fazer a pessoa voltar no tempo...
Passando os olhos pelas outras vitrines, viu um par de brincos bonitinhos. Chegou mais perto, mas o preço estava escrito com uma letra minúscula, quase que se escondendo de vergonha. Teve que praticamente grudar o nariz no vidro pra enxergar: 19999,99.
Ainda com o rosto colado no vidro já embaçado, percebeu um segurança carrancudo se aproximar.
- Acho que ela não vai gostar - murmurou em voz alta enquanto descolava o nariz da vitrine e saia de fininho, acompanhado pelos olhos do segurança.
Foi quando se lembrou: era pra não deixar a tampa do vaso levantada... Ah bom.
(fim)
- O senhor deseja alguma coisa? - diz uma moça toda sorridente. Arílson responde, todo tímido:
- Hã.. bom, estou só dando uma olhadinha... quer dizer, não pra mim, é pra minha esposa.
- Entre, fique à vontade, vou "estar buscando" umas peças que "estão acabando" de chegar!
Ele entrou e tentou ficar à vontade. Claro que não ficou. Com meia-dúzia de senhoras falando em bojos, taças, ligas e elásticos ele se sentia o único macho num raio de uns 250 quilômetros.
A vendedora voltou:
- Qual o tamanho dela?
- Dela? - perguntou assustado apontando para uma senhora de uns 120 quilos passava na frente dele carregando um poodle. - Ah! da minha esposa? Tamanho? Sei não... acho que é parecida com você, talvez um pouco mais alta - arriscou, coçando a cabeça, tentando se lembrar das proporções pra depois convertê-las em alguma unidade métrica que a moça entendesse.
Mas nem precisava. Ela - como qualquer mulher em uma loja - está mais empolgada do que ele e já escolheu:
- Ah, então esse vai ficar muito bonito. O que o senhor acha?
Ele não sabia o que achar, mas antes dele conseguir falar qualquer coisa, ela já tinha outra peça na mão:
- Mas tem essa outra aqui ó. É um pouquinho menos discreta. E tá usando...
Menos discreta? Ele ficou procurando. Conseguiu ver um pedacinho de pano atrás da etiqueta do preço (que crescia de forma inversamente proporcional à quantidade de tecido utilizado, indo contra todas as regras para cálculo de custos e precificação). E "tá usando" é a desculpa para nós também usarmos coisas que jamais usaríamos normalmente.
- Obrigado, vou dar mais uma olhadinha...
Saiu correndo... talvez no ano que vem. Esse ano, ele queria algo mais elegante, talvez uma joia.
(continua...)