terça-feira, 28 de novembro de 2006

Painel de controle


Aconteceu outro dia: assim que acordei vi que minha cidade era controlada pelo Windows. Ainda na cama, enquanto ainda esfregava os olhos, apareceu no ar uma telinha flutuante, semi-transparente, com meu nome e esperando uma senha. Ali, bem na minha frente. Até tentei me levantar, mas não conseguia sair do lugar. Como não tinha nenhum teclado por perto, falei a senha bem baixinho e a tela sumiu.

Abri a janela do quarto dando um duplo clique com o dedão e reparei que o céu estava lilás. As nuvens meio esverdeadas e o sol era azul! Depois cinza, depois verde-água! Olhei pra rua e vi que tinha uma menininha brincando com o painel de controle. Ela bem que tentou colocar uma fotografia dela com um poodle recém-tosado na praia, como papel de parede celeste, mas a foto ficou toda esticada (acho que a resolução era muito baixa pra cobrir todo o firmamento), então ela voltou para o fundo lilás. De péssimo gosto, por sinal.

Resolvi sair pra caminhar pelo bairro e ver o que mais havia de novo. Enquanto eu caminhava, de vez em quando, apareciam janelinhas azuis do meu lado direito avisando: "Fulaninho entrou", ou "Beltrano está chamando sua atenção". Mas eu nem ligava. Parei na uma pracinha e me sentei em um banco. Fiquei olhando as nuvens verdes mudando de forma sobre o infinito lilás do céu. "Aquela lá ó, parece o Hulk... bem ali ó, do lado do pé de alface!". Fiquei ali por uns cinco minutos, praticamente sem me mover. Foi quando, de repente, escureceu tudo.

Era a proteção de tela.

sexta-feira, 10 de novembro de 2006

Sr. Dito & Mr. Slogan


Mr. Slogan convidou o Sr. Dito para uma conversa à mesa de um café. "Quem é vivo sempre aparece, hein?", disse Sr. Dito. "Pois é. Dedicação total a você!", respondeu o sempre bajulador Mr. Slogan.

Mr. Slogan tentava convencer Sr. Dito a viver de merchandising, como ele: "É como eu dizia, Dito, você devia abandonar o uso desses ditados populares. Faça como eu. Alías, eu sou você amanhã. Just do it!". Mas o sr. Dito não queria saber da agitação do mundo artístico. "Isso não é pra mim, Slogan. Quem nasceu pra vintém nunca chega a tostão. Você sabe: pau que nasce torto...".

"Eu sei, eu sei que parece cansativo", rebateu Slogan. "Parece mas não é. O salário não é nenhuma Brastemp, é verdade, mas também não é de todo mau: vale por um bifinho. Veja o meu caso: o tempo passa, o tempo voa, mas a minha poupança continua numa boa. Dei até férias para meus pés..." e terminou com o incentivo: "Desperte o tigre em você!".

Sr. Dito retrucou: "Nem tudo que reluz é ouro, Slogan. Além disso, você está cansado de saber que quando a esmola é grande até o santo desconfia." E completou, com ar de sabedoria: "Mais vale um pássaro na mão do que dois voando."

"Dito, eu sei que há coisas que o dinheiro não compra. Para todas as outras existe...", disse Slogan, mas não completou a frase. Foi interrompido pelo Sr. Dito, que falou com firmeza: "Sabe o que eu acho? Quem tudo quer, tudo perde. E quem nunca comeu melado, quando come se lambuza. Afinal, Deus ajuda quem cedo madruga."

"Mas eu amo muito tudo isso! Vem pra Caixa você também! É feito pra você. Nem parece banco." implorava Mr. Slogan, enquanto fazia sinal para o garçom. Mas, Sr. Dito não se abalava: "Quem ri por último, ri melhor!", dizia sorrindo quando o garçom chegou e ofereceu o cardápio.

Mr. Slogan desistiu de convencer o amigo: "Então tá. Deixa o homem trabalhar, afinal, nós viemos aqui pra beber ou pra conversar?". "É isso aí. Pra bom entendedor, meia palavra basta", concordou Sr. Dito. "Aceita algo mais forte? Desce macio e reanima" ofereceu Sr. Slogan. "E aqui é mais barato, mais barato! Preço melhor ninguém faz.". Mas Sr. Dito diz que prefere só um cafezinho. Slogan não resiste: "Bons momentos pedem um bom café..."

quarta-feira, 6 de setembro de 2006

O presente (parte III) - Em busca do cálice sagrado

Joalherias são sempre lindas! Nunca se vê ninguém comprando nada dentro delas, mas elas estão sempre lá: pomposas, brilhantes... Até esse dia, ele achava que elas serviam só pra enfeitar os corredores de shopping centers.

Hoje ia entrar em uma. Escolheu a mais bonita do shopping, foi até a vitrine mais vazia: só tinha um relógio. Procurou o preço, e encontrou um número escrito num cantinho bem pequenininho em letras bem miudinhas: 58998. Provavelmente era só um código de referencia ou talvez a quantidade em estoque. Ou podia ser que estivesse faltando a vírgula dos centavos. Não, não, estava certo. Ficou imaginando que "poder" teria o tal relógio pra custar tanto? Vai ver ele consegue fazer a pessoa voltar no tempo...

Passando os olhos pelas outras vitrines, viu um par de brincos bonitinhos. Chegou mais perto, mas o preço estava escrito com uma letra minúscula, quase que se escondendo de vergonha. Teve que praticamente grudar o nariz no vidro pra enxergar: 19999,99.

Ainda com o rosto colado no vidro já embaçado, percebeu um segurança carrancudo se aproximar.

- Acho que ela não vai gostar - murmurou em voz alta enquanto descolava o nariz da vitrine e saia de fininho, acompanhado pelos olhos do segurança.

Foi quando se lembrou: era pra não deixar a tampa do vaso levantada... Ah bom.

(fim)

segunda-feira, 4 de setembro de 2006

O presente (parte II) - A missão

- O senhor deseja alguma coisa? - diz uma moça toda sorridente. Arílson responde, todo tímido: 

- Hã.. bom, estou só dando uma olhadinha... quer dizer, não pra mim, é pra minha esposa.

- Entre, fique à vontade, vou "estar buscando" umas peças que "estão acabando" de chegar!

Ele entrou e tentou ficar à vontade. Claro que não ficou. Com meia-dúzia de senhoras falando em bojos, taças, ligas e elásticos ele se sentia o único macho num raio de uns 250 quilômetros.

A vendedora voltou:
- Qual o tamanho dela?

- Dela? - perguntou assustado apontando para uma senhora de uns 120 quilos passava na frente dele carregando um poodle. - Ah! da minha esposa? Tamanho? Sei não... acho que é parecida com você, talvez um pouco mais alta - arriscou, coçando a cabeça, tentando se lembrar das proporções pra depois convertê-las em alguma unidade métrica que a moça entendesse.

Mas nem precisava. Ela - como qualquer mulher em uma loja - está mais empolgada do que ele e já escolheu:

- Ah, então esse vai ficar muito bonito. O que o senhor acha?

Ele não sabia o que achar, mas antes dele conseguir falar qualquer coisa, ela já tinha outra peça na mão:

- Mas tem essa outra aqui ó. É um pouquinho menos discreta. E tá usando...

Menos discreta? Ele ficou procurando. Conseguiu ver um pedacinho de pano atrás da etiqueta do preço (que crescia de forma inversamente proporcional à quantidade de tecido utilizado, indo contra todas as regras para cálculo de custos e precificação). E "tá usando" é a desculpa para nós também usarmos coisas que jamais usaríamos normalmente.

- Obrigado, vou dar mais uma olhadinha...

Saiu correndo... talvez no ano que vem. Esse ano, ele queria algo mais elegante, talvez uma joia.

(continua...)

quarta-feira, 30 de agosto de 2006

O presente (parte I)

Já iam completar três anos de casados. Passou rápido. Dessa vez Arílson queria comprar um presente melhorzinho. Ainda sentia uma pontinha de vergonha do ano anterior, quando dera de presente uma garrafa térmica. Embrulhada no papel de presente das Lojas Americanas. Mas ele achou tão bonita, e ainda por cima tão útil! Ela, muito educada, agradeceu e tudo, mas pareceu um pouco decepcionada.

Havia lido recentemente numa revista que mulheres costumam dar "dicas" do que elas querem ganhar de presente, alguns dias antes da data esperada. Ficou pensando um tempo, tentando se lembrar de alguma coisa que tinha ouvido ela falar muito desde o casamento. Lembrou-se de ter ouvido por diversas vezes alguma coisa sobre a "tampa do vaso". Será que ela queria trocar por uma daquelas fofinhas? Não, isso não deve ter a ver com presente...

Achou melhor esquecer isso de dicas subliminares e partir para a ação. Naquele dia durante o almoço, saiu do trabalho e deu uma escapadela até o shopping center mais próximo. Assim que chegou, deu de cara com uma loja de lingerie. Passou na frente da vitrine, deu meia-volta, passou de novo...


(continua...)

sexta-feira, 28 de julho de 2006

O Cravo brigou com a Rosa


A acusada (acima) preferiu não dar entrevistas


Hoje pela manhã, uma terrível discussão chocou os habitantes do Jardim das Flores, já traumatizados com os recentes casos de pulgões na região. Segundo testemunhas, os noivos, Cravo e Rosa, haviam marcado um encontro na floreira debaixo da sacada do 2º andar, ocupado por Dona Neusa Alecrim.

Ainda segundo os observadores, a peleja teve início porque o Cravo, morador da floreira da sacada do 1º andar, teria chegado atrasado, deixando Rosa, moradora do vasinho da janela da cozinha, esperando plantada. Segundo esta reportagem pôde apurar, o atraso teria sido causado por um funeral de última hora que obrigou o Cravo, que é funcionário da Funerária Flor do Paraíso, a trabalhar até mais tarde na noite anterior.

Depois de breve discussão, Rosa (que trabalha como modelo em eventos e casamentos) supostamente teria acertado um tapa no caule do noivo com um espinho. Isso fez com que ele caísse ferido e fosse levado às pressas ao pronto-socorro do Hospital Oliveira Ramos, na Rua Jasmim, Jardim Primavera. Segundo a assessoria de imprensa do Oliveira Ramos, o ramo chegou em estado estável com apenas duas pétalas quebradas e passa bem.

Após o suposto delito, a Rosa foi encaminhada ao 23º Departamento de Polícia Floral e, em seguida liberada por falta de provas, já que o réu decidiu não prestar queixa. Segundo o delegado que atendeu o caso, ela disse estar "muito arrependida" e se sentindo "despedaçada".

Em seguida, a Rosa pediu permissão para visitar o Cravo, que se encontrava na UTI. Durante a visita, a pulsação do vegetal teria se alterado causando um breve desmaio. A flor, em prantos, teve que deixar o local por orientação médica. O Cravo permanece em observação.



segunda-feira, 10 de julho de 2006

Café com blog


- Mãe, faz um blog pra mim?

- Melhor não. Você ainda nem almoçou... capaz de perder a fome.

- Ah mãe, faz pra mim. Na escola todo mundo já tem um.

- Tem o que menino? Do que você tá falando?

- Um blog, mãe.

- Blogue? Eu hein? Pede pro seu pai. Quem sabe ele compra.

[...]

- Pai.

- Que é, filho?

- Eu quero um blog!

- Não, não...faz mal pros dentes. Chupa uma mexerica.

- Hã?...

[...]

- Pai, eu não tô com fome... eu quero um blog.

- Ah, esse mês não vai dar não. Não posso mais gastar em nada. No mês que vem quem sabe.

- Mas não é de comprar, pai. Tem que criar.

- Pior ainda! Aí tem que comprar ração, levar no veterinário... - Não é isso, pai. Deixa eu explicar: blog é uma espécie de diário eletrônico na internet. Serve pra escrever coisas ou colocar fotos.

- ...!

- Entendeu agora?

- Isso é jeito de falar com seu pai, menino? Vai pro teu quarto já! Onde já se viu... como se eu não soubesse o que é um blogue! Oras...

(humpf!)

quarta-feira, 21 de junho de 2006

Googlear é preciso

"Agora, acho que já tenho palavras-chave
suficientes pra consultar o Google"



Esses dias meu olho andou tremendo... Sabe quando o olho da gente começa a tremer? Dizem que é falta de sono, cansaço, sei lá. Bem, o fato é que fiquei curioso pra saber exatamente que piscação toda era essa e pesquisei... no Google.

Primeiro tentei: olhos+piscando+sozinhos. Imaginava encontrar centenas (ou pelo menos dezenas) de citações de médicos, oftalmologistas e psicólogos informando a causa da piscaria e dando até, quem sabe, algumas dicas sobre como pará-la. Mas o que encontrei foram 31 citações de livros, poesias, canções... desde Clarice Lispector até blogueiros desconhecidos. Nada de piscadeira, piscação, tremedeira ocular. Em compensação lá estava "Antonio que, sozinho, mal tirava os olhos do livro imaginado sua amada, nem sequer piscando..." fazendo companhia ao "rapaz de pequenos olhos piscando nervosamente" do outro link.

Tentei outra: olho+sistema+nervoso+tremendo. Dessa vez não tinha como escapar. Que tipo de literatura ousaria citar "sistema nervoso" no meio do texto? Pois elas existem. E lá veio "Anabela de olho arregalado gritava no banheiro. Um tremendo eco envolvia sua voz e tomava conta do seu sistema nervoso...". Das 27.200 citações, a maioria usava "tremendo" assim mesmo, como aquela voz que anuncia a Sessão da Tarde ("...as aventuras de uma tremenda gata...").

Nova tentativa: olho+pisca+involuntariamente. Poesias, contos, romances. Olhos+piscando+sono+nervoso. Reaparece Clarice Lispector e seus "Laços de Família". Fico curioso pra saber o que acontece quando "Antonio tira os olhos do livro", mas não posso fugir ao meu desafio.

Finalmente: olho+treme. Lá está: "Por que às vezes o meu olho treme?". Resposta de um site de curiosidades: "O espasmo das pálpebras é causado pela contração do músculo orbicular. A causa mais provável é que seja provocado pelo cansaço ou tensão."

Ah bom...

quinta-feira, 8 de junho de 2006

Lua-de-mel


- Viu como ela tava linda?

- Eu sempre achei nossa filha linda! Aliás, parecia você no dia do nosso casamento. Aquele mesmo sorriso que você dá quando tá nervosa e o...

- Será que eles estão bem? Essas estradas são tão perigosas.

- Claro que sim. Se eles precisarem de alguma coisa eles ligam. Mas como eu ia dizendo, você lembra de como nós...

- Acho que vou telefonar pro celular dela. Vai que aconteceu alguma coisa, né?

- Não vai telefonar pra ninguém não! Tá doida? Telefonar pro casal em lua-de-mel? Acho que você tá é curiosa. Deixa os dois...

- Tá bom. Você tem razão. Não vou ligar não. Afinal, se acontecer alguma coisa, eles ligam né? A não ser que eles tentaram ligar e eu não estava em casa... Acho melhor dar um só "toquinho" no celular pra eles verem que eu já cheguei.

- Que "toquinho", Marisa! Imagina agora a mãe da noiva ficar dando toquinho no celular em plena noite de núpcias! Coitado do genro...

- Que é que tem? Ele vive dizendo que gosta tanto de mim.

- É. Por enquanto.

- Como assim, por enquanto?

- Enquanto você não dá "toquinho" no celular dela logo na noite de núpcias, oras.

- Ele nem vai perceber. Eu pedi pra ela deixar no modo silencioso. Ela só precisa responder se tá tudo bem.

- Tá tudo bem sim. E me dá aqui esse telefone! Hoje ninguém usa o telefone nessa casa.

- Tá bom, tá bom...

(...)

"Alô? E aí, me conta: tá tudo bem?"

- MARISA!!!

- Tá bom, já desliguei!

"Depois te ligo... tchau!"

terça-feira, 2 de maio de 2006

Orgulho da vovó

- E a senhora, já tem netos?

- Tenho, dona Elza! - diz, com um ar orgulhoso - Um casal. O mais novo diz que quando crescer quer ser engenheiro e...

- Ah! Eu tenho quatro. Dois são formados em faculdade com diploma e tudo - interrompe a outra velhinha com os olhos até brilhando de orgulho - A mais velha é adevogada!

- Que coisa linda! E pensar que no meu tempo, menina não devia estudar... E o outro?

- Então, o outro é que eu não sei direito o que faz. Diz que é "analista"...

- Ah sim, estudou psicologia?

- Não, não. Ele trabalha com computador, sabe? Parece que ele faz programas...

- Ai que horror, Dona Elza! Essa juventude de hoje...

- Não esse tipo de programa...

- Ah, programa de televisão? De rádio? Meu primo fazia um programa na São Geraldo AM em 58. Falava tão bonito e...

- Também não é isso. É programa e tem a ver com computador. Uma vez ele tentou me explicar: disse que tinha que ver com uma linguagem, "que nem" japonês, inglês..., mas não servia pra falar com outra pessoa. Era só pra conversar com a máquina. Ele escreve nessa língua e a máquina entende.

- Será que ele sabe consertar liquidificador? O meu quebrou faz dois meses.

- Sei não. Deve saber né? Se ele conversa com as máquinas...

(silêncio...)

- Quer dizer que a mais velha é adevogada?

- Ah! Essa sim. Sempre foi inteligente...

quarta-feira, 29 de março de 2006

O espaço: a fronteira final

Porãsy VI, minutos antes do lançamento


Faltavam apenas duas horas para o tão aguardado lançamento da Porãsy VI, a primeira nave espacial totalmente made in Brasil. O nome escolhido, pra variar, vinha da mitologia tupi (era o nome da índia que, ao sacrificar-se pela tribo, tornou-se o planeta Vênus). Por fora, a nave carregava dois foguetes usados, comprados sem licitação do governo do Paquistão. Em cada um estavam escritas as marcas das empresas patrocinadoras: Fanta Uva, Caninha 51 e Fogos Caramuru.

Entre os cientistas e técnicos que fariam parte da inédita missão estavam também o neto de um senador do Maranhão e uma empregada doméstica vencedora do concurso "Astronauta Por Um Dia" promovido pelo Caldeirão do Hulk. Levavam na bagagem, instrumentos de medição de alta tecnologia, tubos de ensaio com organismos vivos para testes e exames, 12 CD's de axé, DVD's piratas dos filmes "Apollo 13", "Guerra nas Estrelas" e "Dois Filhos de Francisco", quatro caixas de cerveja e um saquinho de amendoim torrado. Levavam também uma bandeira brasileira amarrada em um berimbau que seria espetado em algum asteróide.

Havia uma certa tensão no ar, já que essa era a sexta tentativa (as outras 5 naves explodiram antes da decolagem matando todos os bons cientistas que estavam por perto. Por falta de mão de obra qualificada (e ainda viva), a Porãsy VI teve de ser construída por um mecânico, dois serralheiros e um motoboy, que ajudava depois do expediente).

Após três tentativas frustradas na Base de Alcântara e duas na Barreira do Inferno, em Natal, foi decidido que esse lançamento seria na praia de Copacabana e após ele haveria uma apresentação da bateria da Unidos da Tijuca. Um milhão e meio de pessoas se acotovelavam na praia (a uma distância segura de 2 metros dos foguetes nucleares) aguardando o espetáculo do lançamento.

O Presidente aproximou-se da nave seguido por sua comitiva e recebeu do seu cerimonial uma garrafa de Cidra Cereser. Em seguida chacoalhou a garrafa até que a rolha estourasse na direção da nave, atingindo e danificando permanentemente o módulo de expulsão de dejetos (imediatamente a tripulação franziu o nariz de nojo, imaginando como seria ficar lá em cima sem poder dar descarga).

Nesse momento, dá-se início à queima de fogos e na TV aparece o Galvão Bueno berrando: "Boa tarde amigos. Falamos agora ao viiiivo direto da praia de Copacabana para mais esse evento emocionante..." Segue-se o famoso "Brasil-il-il" com mais eco do que nunca. Depois de entrevistar os 3 convidados especiais (Arnaldo Jabor, Casagrande e Sheila Melo) sobre a "emoção" e o orgulho de pertencer a um dos 351 países com tecnologia espacial, ele começa a contagem regressiva: "10, 9, 8, 7 [Começa a tocar a musiquinha do Ayrton Senna]... 3, 2, 1. Sai que é suuua, Porãsy!".

A multidão prende a respiração. Os motores são acionados e em poucos segundos a nave é impulsionada rumo ao espaço.

Rumo ao infinito.

Sete segundos mais tarde atinge o Pão de Açúcar.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2006

Deadlines...


Tem gente que bate no peito (no deles, é claro!) e diz que só consegue trabalhar se for sob pressão. Nas empresas, fala-se o tempo todo em prazos, metas... querem que as pessoas façam duas, três, dez coisas ao mesmo tempo. Tudo é pra ontem; e se der pra entregar antes, melhor. Tem gente que diz que isso é produtividade, faz parte do tal "processo de globalização" (e eu que achava que o mundo sempre tinha sido um "globo", imagine...).

Já dizia o filósofo Garfield, the Cat*: take it easy, my friend. Fato é que muitos prazos justíssimos e metas absurdas não são, na maioria das vezes, realmente importantes. A não ser, é claro, que você seja um cirurgião com um coração escancarado à sua frente, dificilmente alguém vai morrer se você não terminar aquele serviço até às 16 horas da sexta-feira ou não entregar aquele gráfico rídiculo em forma de pizza de calabreza a tempo.

Muitas vezes os prazos absurdos existem só pra que o chefe consiga "mostrar quem é que manda nessa joça" ou pra alguém valorizar o servicinho medíocre que ele tem, fazendo parecer que aquilo é a coisa mais importante para a humanidade nos próximos dias e que sem isso, a fome irá prevalecer e as guerras continuarão indefinidamente.

Ainda bem que o resto do mundo (ainda) não é governado pelos prazos e deadlines que regem as empresas. Imagine se todas as outras atividades humanas fossem coordenadas por uma espécie de "gerente de vidas" que emitiria um cronograma semanal e penduraria na sua geladeira só pra te mostrar como você é medíocre e está atrasado. Pelo cronograma dele, já era pra você ter feito mestrado em Harvard e estar disputando a vice-presidência da Coca-Cola. Enquanto você, só quer saber se tem Coca-Cola na geladeira! "Teremos que rever suas metas", ele diria.

A pressão resultante iria se propagar pelos "escalões inferiores": a namorada intimaria o rapaz em uma sala de reuniões. Ela estaria sentada em uma cadeira estofada em frente a uma mesa imensa com um notebook ligado em um projetor e os pézinhos balançando, nervosa:

- Cléverson, eu estava analisando algumas planilhas e cheguei a conclusão de que nosso namoro está se extendendo além do prazo pré-estabelecido. Pelo gráfico podemos observar que muitas das minhas amigas já se casaram e outras estão com os papéis em andamento. Estamos ficando pra trás. Preciso de uma posição sua ainda essa semana.

Em outra família, os pais se reuniriam com o bebê de 1 ano e meio, em volta do berço:

- Júnior, nós percebemos que você tem feito algum progresso em engatinhar, mas precisamos que você esteja andando até o próximo fim de semana.

- Isso mesmo. Queremos resultados! - diria o pai-diretor geral, exaltado.

- Gu Dabadaá.

- Veja bem. Não precisa ser um atleta, não é isso. Pode até mancar um pouquinho, não tem problema. O que eu preciso é de alguma coisa pra mostrar para os seus avós. Se você conseguir, nós voltamos a conversar sobre aquele aumento no leite da mamadeira.

- Dáááábidá...


* Filósofo felino altamente motivado

sexta-feira, 20 de janeiro de 2006

Velho lar, doce lar

Parece que dessa vez eles tinham encontrado o lugar perfeito. Desde o casamento, pagavam o aluguel em dia, mas sempre guardavam um pouquinho todo mês pro dia em que teriam seu próprio cantinho. Agora tinham conseguido.

Fechado o negócio, era hora de começar a empacotar as coisas. Os dois estavam radiantes: a nova casa era ampla e espaçosa, bem arejada, decoração moderninha. Poderiam ter um cachorro (ou dois, quem sabe) e convidar quantas pessoas quisessem para visitá-los. Não viam a hora de se livrar daquela casinha alugada, apertada, daqueles móveis baratos...

Já com tudo devidamente encaixotado, ele puxou uma das gavetas do criado mudo só pra garantir que não tinha esquecido nada lá no fundo. Viu a pontinha de um papel brilhante atrás da gaveta; puxou-a com cuidado pra não rasgar - era uma fotografia meio empoeirada. Havia sido tirada uns quinze dias antes de se casarem. Ele se lembrou que nesse dia alguns parentes e amigos tinham ido até a casa recém-alugada ajudar na pintura. Afinal, recém casados mereciam uma casa arrumadinha. Tinha ido também um tio, daqueles do tipo "faz-tudo", fazer a ligação elétrica do chuveiro, da máquina de lavar (que ainda nem tinha chegado)... Por sinal, tudo novinho. Depois que terminou o dia, todo mundo estava exausto, mas continuavam lá sentados no chão imundo e respingado de tinta, jogando conversa fora.

Ele olhou a foto mais uma vez e viu lá no cantinho, um pedaço da parede que ainda não estava pintado, uma cor escura, horrível. Como era feia aquela casa! E eles tinham conseguido fazer dela um lugar tão aconchegante, tão alegre. Bons tempos...

Enquanto isso, ela olhava embaixo da pia, procurando por alguma panela perdida e acabou encontrando uma grelha e dois espetos. Tentou se lembrar de quem era aquilo. Tinham emprestado de uns amigos no dia em que completaram 2 anos de casados. Fizeram um churrasco na pequena lavanderia. Dentro da casa, os amigos se apertavam, alguns de pé, outros sentados no chão mesmo, mas ninguém parecia se importar muito com o desconforto. Se sentiam em casa. Lembrou-se de terem jogado baralho com outro casal depois que todos já tinham ido embora e que de tão cansados acabaram dormindo ali mesmo na sala, um no sofá e outro no puf.

Ela sorriu e colocou a grelha de canto pra não se esquecer de devolver. Ele enfiou a fotografia no bolso da calça e foi ajudar a carregar o restante da mundança. Mas por um momento, ambos pensaram em desistir de mudar e ficar ali. Só mais um pouquinho.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2006

"Branco ou dourado?"

As mulheres devem achar que os maridos são gênios da moda. Que eles estão na profissão errada, já que todos eles deveriam ser estilistas (só para constar: se eles realmente levassem jeito pra isso dificilmente seriam "maridos" - pelo menos não no sentido aceito pela comunidade). Deve ser isso, porque todas elas ao se arrumarem pra sair, têm o hábito curioso de perguntar ao marido:

- Você acha que essa saia combina com essa blusa?

A maioria dos maridos responde invariavelmente que sim, mesmo que a dita saia seja roxa com bolinhas azuis e a blusa tenha um babado pink do século XV cravado de lantejoulas coloridas. Isso porque eles sabem que qualquer que seja a resposta, ela já sabe exatamente o que ela vai vestir. Ela já passou as últimas três horas imaginando como ficaria cada roupa, sapato, cabelo, maquiagem e todas as 213.614 combinações possíveis. Por isso não surpreende que o gentil leitor indague: "Por que então, a minha senhora ainda insiste em me perguntar com qual saia ela fica melhor?".

Boa pergunta. Já no Egito antigo foram encontradas múmias de esposas de faraós com as mãos fechadas segurando algo que os arqueólogos imaginam ser duas túnicas diferentes, na direção do sarcófago real. Uma delas tinha até brincos diferentes em cada orelha. O mesmo se deu na chegada das caravelas de Portugal em nossas terras: relatos paralelos ao de Caminha afirmam terem presenciado índias com cara de bolacha perguntando ao cacique se deviam se pintar com o vermelho do urucum ou com o branco da tabatinga. O cacique acendia um cachimbo e apontava para a cor preferida. Elas sempre escolhiam a outra. (Aparentemente esse era o motivo dos caciques aceitarem trocar ouro, pedras preciosas, qualquer coisa... por um espelhinho).*

Esse ritual se repete há séculos. Antes de sair, a esposa, no seu estado pré-maquiagem, pergunta se a roupa ficaria melhor com o sapato branco ou com o dourado. Se você responder "branco", ela dirá: "Por que? Você não gosta do dourado?", o que levará a uma interminável sequencia de testes e experimentos com todos os pares de sapato possíveis. Psicólogos do mundo todo argumentam que isso é causado pela necessidade de ter uma segunda opinião, pela saudade da mãe, da irmã, da amiga, etc.

A solução encontrada por muitos foi continuar concordando, independentemente da pergunta. Veja um exemplo elucidativo:

- Com qual brinco você acha que eu devo ir? O pequeno ou o grande?

- Sim.

- Ah... eu também gosto mais do grande. Obrigada.

Para isso funcionar é necessário olhar fixamente para o objeto em questão e franzir a testa como se realmente se importasse (mesmo que o cérebro esteja pensando no jogo, nas contas ou na crise da ex-Iugoslávia).

De qualquer forma, sustento a tese de que homens não são os seres mais apropriados para esse tipo de questionamento. Em geral, nós temos apenas dois pares de sapato (o preto e o marrom), duas calças jeans (a velha e a nova), sete camisas (uma para cada dia da semana - sendo utilizadas na ordem em que forem dispostas nos cabides) e um cinto bicolor (daqueles que se usam dos dois lados - um para o sapato marrom outro para o preto).

A propósito, amável leitora, pode continuar perguntando. Nós bem que gostamos.


* Informações históricas de fontes não muito confiáveis, porém muito imaginativas.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

O barulhinho

9h31, oficina:

- Que barulhinho?

Cric, cric, cric.

- Esse ó... tá escutando? Parece um grilo, sei lá . Só faz quando piso no acelerador.

Cric, cric, cric.

- Faz o seguinte: deixa o carro aqui pra eu dar uma olhada e a noite você vem buscar.

- Olha lá, hein? Não vai trocar coisa que não precisa! Da outra vez, ficou uma fortuna.

- Pode deixar, seu Osvaldo. Qualquer coisa eu ligo pra avisar.

(...)

13h23, trabalho do Osvaldo:

- Alô, seu Osvaldo?

- Fala Pereira. Descobriu o que é aquele barulhinho?

- Então: eu tive que desmontar a junta do bólido pra verificar o cabeçote da clavícula e...

- Carro tem clavícula?

- Tem sim senhor. Duas. Uma pra cada cachaça da ventoinha. O senhor não sabia?

- Er.. ah sim, claro. Tinha me esquecido. Mas e aí?

- Bom, eu descobri que o anel de borracha que veda a clavícula tava meio ressecado. Tomei a liberdade de trocar pro senhor.

- E era isso que fazia aquele barulhinho?

- Acho que não era não. Mas desconfio que, se não é lá, deve ser na copa da cabeça da arruela central.

- Hmm... acha que fica pronto hoje?

- Claro que fica, doutor.

(...)

17h24, oficina:

- E aí? Já tá pronto?

- Se o senhor esperar só mais meia horinha eu fecho tudo.

(...)

20h56, ainda na oficina:

- Prontinho, doutor.

- E quanto ficou?

- Então, eu aproveitei que o carro tava aqui mesmo e já troquei as velas, o filtro de ar, a bomba de combustível, o óleo do carter, o abafador eletrostático, o rodamoinho da varicela, o...

- Mas eu não pedi pra me avisar antes?

- Sabe o que é, doutor? Se não troca essas coisinhas, esse carro ia te deixar na mão. Já imaginou, a patroa dirigindo a noite lá na marginal Tietê e o carro enguiça? Melhor prevenir...

- Mas quanto ficou tudo?

- Bom, tá tudo anotado aqui. As peças e a mão-de-obra.

- Pôxa, tudo isso? Mas não tem jeito né? Ia ter que trocar mesmo...

- Ah, ia sim doutor. Agora tá que nem novo. Ficou esse preço porque eu consegui um desconto muito bom. Tive que ir buscar essas peças do outro lado da cidade. Se o senhor achar melhor pode até fazer um cheque pro dia 10.

- Pelo menos o barulhinho parou?

- Barulhinho? Ah... olha, eu não escutei esse barulhinho mais não. Devia ser a porca da homocinética do joelho abdominal. Tava meio froxa, eu dei uma apertada...

(...)

21h10, dirigindo pra casa:

- Gente boa esse Pereira. Conseguiu até um desconto nas peças e já deu uma revis...

Cric, cric, cric...

sexta-feira, 6 de janeiro de 2006

A família do barco (parte II)

Ele já tinha ouvido falar nessa história do barco. Dia desses até ia dar uma espiada na construção. Segundo ouvira, mais parecia uma enorme caixa; uma arca daquelas que as avós têm na beira da cama, daquelas de guardar coisas velhas, mas que consideramos valiosas demais pra deixar em qualquer canto. Pois era assim mesmo o "barcão". Quadrado, fechado em cima e com uma porta enorme na lateral. Nem parecia um barco e, pelo que diziam, se conseguisse boiar na água já fazia muito. Alguns que foram visitar a obra contavam que dentro tinha três andares e diversos estábulos.

O menino se lembrava de que uma vez a família do barco (já eram conhecidos como a "família do barco") fez uma visita à casa dele. Todos pareciam muito amigáveis. Se acomodaram na sala grande e conversaram por mais ou menos uma hora. De uma forma muito tranquila, explicaram porque contruir uma embarcação tão grande, já que eles estavam a centenas de milhas do oceano mais próximo. Falavam alguma coisa sobre o mundo estar muito ruim, cheio de violência e mencionaram uma tempestade. Eli ficou pensando se estavam falando do clima.

Aliás, pouco entendia do que diziam. Quando perguntava alguma coisa para os mais velhos, eles davam de ombros: "Não se preocupe. As coisas estão melhorando..."; lhe davam um doce de tâmaras (receita da bisavó de Eli - a princípio a receita usava figos, mas depois foi adaptada) e ele ficava tranquilo. Uma vez, perguntou para sua irmã mais velha o que ela achava da tal família do barco. Ela disse pra não perturbar - estava preparando as coisas pro seu casamento. Ela se casaria em duas semanas e finalmente arrumara alguém para ajudar a cuidar dos gêmeos.

Os pais também pareciam que não se importavam muito com a situação ruim, as notícias e muito menos com a "família do barco". Achavam até bom que as coisas estivessem assim, meio confusas, aí conseguiam ganhar um extra, escondendo debaixo das roupas algum dinheiro do Sr. Nabuco. "Todo mundo faz isso, ele nem vai perceber." - diziam - "Aliás, ele bem que merece - aquele safado!".

Mas naquele noite depois da visita da "família do barco", os pais de Eli ficaram pensativos: "Será que é aquele homem tem razão?". "Acho que não...bem, vai saber." - Os argumentos dele pelo menos eram bons.

Chegaram até a tocar no assunto no bate-papo com os vizinhos. Mas aí, acabaram tomando mais uma jarra de vinho, e depois mais uma - por fim acharam tudo aquilo muito rídiculo. Como alguém poderia acreditar numa bobagem dessas? Aliás, chegava a ser uma ofensa. E se um dos filhos deles acreditasse naquilo! Era melhor avisá-los pra evitar andar perto daquela família. Gente estranha...!

Passaram-se alguns meses e um bando de velhotas que vivia espionando a vida alheia viu que a porta do barco se tinha fechado. Alguém disse que viu um homem diferente, muito "grande", fechando a porta do barco por fora. E era sobre isso que conversavam os vizinhos de Eli.

Foi quando ele ouviu um estrondo, olhou pro céu, e viu uma nuvenzinha preta...



fim

A família do barco (parte I)


Raios de sol atingiam as pernas gordinhas do Eli enquanto ele brincava no montinho de areia em frente à sua casa com terraço (era a única casa com terraço da rua - todos morriam de inveja, mas os moradores da casa mesmo, só tinham usado o terraço umas poucas vezes).

Era uma casa grande, não tão grande como os pais do Eli gostariam, mas acima da média. Precisava de uma reforma, é verdade. Em cento e sete anos havia sido revestida (com uma espécie de betume misturado com argila) apenas quatro vezes sendo a última há uns 22 anos.

Via-se um jardim mal cuidado em frente a porta principal que dava para uma grande sala, iluminada por algumas janelas que davam para o lado oeste, ao fundo (de onde era possível ver o vale). Era nessa sala que aconteciam reuniões de família e onde se tomavam decisões importantes. Ultimamente ela só vinha sendo usada para festas e jantares que sempre acabavam em bebedeira e uma boa briga entre os parentes.

Do lado de fora, o jardim terminava em uma cerquinha feita com junco amarrado em feixes e uma pequena abertura que dava acesso ao passeio público. Atravessando-se a cerquinha, bem juntinho dela, havia um montinho de areia quente onde o menino brincava. Eli, que tinha acabado de fazer onze anos, gostava de se sujar na areia com alguns brinquedos rudimentares feitos por ele mesmo, embora seus pais já estivessem planejando colocá-lo pra trabalhar na lavoura do Sr. Nabuco. Precisavam ganhar uns trocados e pagar as dívidas.

Enquanto Eli enchia a pequena caixa de madeira com areia e cascalho, ouviu algumas vozes de pessoas conversando próximos à varanda vizinha. Falavam sobre a tal família que construiu um barco enorme:

- Gastaram uns sessenta anos nessa bobagem. Um absurdo!

- Soube que agora deram pra encher aquele barco com todo tipo de bichos e se fecharam lá dentro!

- Capaz até de pegarem alguma doença...


(continua...)